A alegria dum Sacerdote

Ao terminar a costumada visita aos paroquianos doentes, quando chegava na igreja, o jovem Padre vê uma senhora vir ao seu encontro:

Senhor Prior, venha a casa de um homem que está muito doente! Ele retornou da África há pouco tempo, e está revoltado contra a Religião. Quando alguém lhe propôs de chamar um Padre, disse que não queria recebê-lo. Mas eu tomei a iniciativa de chamar o senhor, pois é preciso salvar essa alma.

Um paroquiano intrometeu-se na conversa: – Padre, o senhor não vai conseguir fazer nada com o doente. Não vale a pena incomodar-se, pois já é quase noite e está a cair neve. Vá para a casa paroquial descansar.

O Padre nem pareceu ouvir a voz do paroquiano. – Eu vou agora mesmo, pois receio não dar tempo de atender o pobre homem. Vou lá cumprir meu dever.

Depois da longa caminhada noturna pela estrada, subindo e descendo morros, chegou e entrou numa casa miserável cujo ar era irrespirável. Na cama perto da lareira o doente tossia forte, quase ao desespero. A idosa mãe lhe fazia companhia, agasalhada num cobertor.

Ao ver o Sacerdote a mulher levantou-se surpresa e o homem doente, com ar de rapagão, muito zangado, gritou-lhe:

Que veio fazer aqui? Vá-se embora, eu não preciso de você. E deu-lhe as costas. – Meu amigo, – respondeu calmo o Pároco – acabo de visitar os meus doentes e como soube que estava de cama, vim vê-lo também. Venho com muito gosto e sem más intenções. Vejo que ficou um pouco aborrecido, mas apesar de tudo, voltarei amanhã. Virei todos os dias rezar com você enquanto estiver doente. Muito boa noite!

A mãe saiu com o jovem Sacerdote e disse-lhe:

– Senhor Padre, não se zangue. Ele não é tão mau como parece. Isto foram as más companhias na África. E agora com essa doença, por favor, não o abandone.

Começou então outra grande prova da sua vida como Sacerdote. A salvação dessa alma. Anos mais tarde ele recordaria tudo com muito consolo, pois as provas mais duras deixam as melhores recordações. Quer dizer, visitar o pobre doente todos os dias, percorrer o mesmo longo trajeto, alguns dias debaixo de chuvas e trovoadas, para só ouvir insultos daquela boca doentia, sem uma palavra de agradecimento. Verdadeiro tormento! Que escola de paciência!

Depois de ouvir sabe lá o quê, o Sacerdote fazia o caminho de volta, pedindo à Virgem Maria, Refúgio dos Pecadores, que tivesse pena daquela alma. Quantas vezes ele soluçava a meia voz e repetia:

Ó Maria, Vós sois a melhor das mães, que socorre sempre os seus filhos tão necessitados. Minha mãe me ensinou a pronunciar Vosso nome nas horas difíceis. E eu tenho recorrido com confiança a Vós e sempre fui atendido. Peço-Vos então por esta alma endurecida pelo orgulho, não para mim, mas para Jesus e para Vós. E como sou Vosso instrumento, farei a Vossa vontade. Amem.”

Depois de rezar esta oração sentia grande paz na alma e compreendia que aquelas palavras de Jesus a Pedro eram também para ele.: “Vai, Pedro meu filho, vai pregar o Evangelho aos pagãos. Compreenderás tudo mais tarde” .

Já tinha feito mais de dez visitas, algumas sem conseguir entrar na casa. Neste dia quando chegou à aldeia disseram-lhe:

– Senhor Padre, ele está muito mal, está mesmo a morrer!
O Sacerdote, confuso, quase nem tinha coragem de bater na porta, onde parou, indeciso. Mas resolveu-se a cumprir seu dever de pastor das almas. Bateu, entrou e aproximou-se do leito. Como sempre, o doente virou-se de costas em sinal de desprezo pela presença dele. O Pároco não desistiu e disse-lhe com um tom carinhoso:

– Meu amigo, chegou a hora final de pensar na sua alma. Estou aqui para isso.

Seguiu-se uma cena horrorizante. O moribundo começa a estrebuchar e insulta-o aos gritos. – Estou mesmo morrendo. Mas ainda tenho forças para pegar um pau e dar-lhe uma pancada na cabeça!

O Sacerdote aproximou-se do rapaz, sentou-se junto aos pés dele e disse:

Aqui você me tem mais de perto para bater em mim. Faça como quiser. O homem calou-se, espantado, e o Pároco continuou: – Amanhã a esta hora estarei aqui para você confessar-se e há de fazê-lo.

Saiu pedindo a Nossa Senhora que não abandonasse aquela alma. No dia seguinte, pela décima e poucas vezes entrou na casa. Maravilha! Encontrou o doente completamente mudado. O Padre sentou-se a seu lado e começou a rezar alto e lentamente, despertando nele sentimentos de verdadeira contrição e depois lhe disse:

Deus Nosso Senhor e a Virgem Maria estão aqui no meio de nós dois. Não tenha receio na confissão, que será muito simples. Eu vou fazer perguntas e você responderá apenas sim ou não.

Na medida que a confissão avançava, as lágrimas do penitente aumentavam. O Padre pediu a Deus que lhe desse um sinal das boas disposições dessa alma. Nesse momento o homem começou a falar:

– Senhor Padre, quero pedir-lhe uma coisa. Deus vai perdoar-me, mas o senhor perdoe-me também. Tratei-o como se trata um cão. Quis bater-lhe e até matá-lo, e apesar de tudo o senhor sempre voltou. Percorreu mais de 300 quilômetros para me ver todos esses dias. Eu fiz a conta. A sua caridade me fez pensar. É um homem sério que acredita nas verdades que diz. O senhor perdoa-me?

Tomado de compaixão o Sacerdote respondeu:

Perdôo-lhe cem vezes, se for preciso! Agora diga comigo o Ato de Contrição.

No fim da confissão e com grande esforço, o moribundo pôs-se de pé e abraçou o Pároco. Depois recebeu a Unção dos Enfermos e o Sagrado Viático. No dia seguinte à noitinha partiu para a casa do Pai. Morreu tranquilo, tranquilo. O Padre veio ao velório. Quando o jovem Sacerdote desceu as encostas, sua alma exultava de alegria. Tinha aprendido por experiência duas verdades:

– que só Deus converte;
– que Nossa Senhora é toda-poderosa quando suplica a Deus.

Este caso, acontecido há mais de 100 anos na França, veio relatado na revista “Irmã Maria Droste Du Vischering”, da Causa de Canonização da Beata Maria do Divino Coração.


Revista “Magnificat” – Braga – Portugal.

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