Poderosa intercessão

Ele correu tanto quanto pôde, temeroso de perder o emprego, mas, passando defronte à Igreja, sentiu como se São Francisco o chamasse e decidiu entrar!

Mariana Iecker Xavier Quimas de Oliveira

O casal Gastinelli não podia esconder sua alegria, pois a jovem esposa logo daria à luz um menino, seu primeiro filho! Giacomo já havia contado aos seus colegas padeiros a boa-nova, e Mirella também comunicara à diretora do asilo, onde trabalhava como cozinheira dos velhinhos.

Com a venda do precioso vaso, o casal conseguiu salvar a situação.
Com a venda do precioso vaso, o casal conseguiu salvar a situação.

Entretanto, algumas preocupações da vida doméstica pareciam querer toldar este contentamento. Como eram pobres, a chegada de mais um membro para a família significava gastos maiores, e esse tema passou a figurar como o centro de muitas das conversas entre Mirella e o esposo. A casinha onde moravam, nas proximidades da Igreja de São Francisco Xavier, era alugada de um proprietário exigente, com prazos fixos de pagamento, e a futura mãe não estava podendo trabalhar naquelas semanas, ficando aflita com o que poderia acontecer.

– Giacomo, faltam poucas semanas para vencer o aluguel de nossa casa. Seu trabalho não rende muito e temos apenas o suficiente para nossa despensa não ficar vazia… Precisamos encontrar uma solução!

– Deus proverá, Mirella! Agradeçamos, pois ainda tenho trabalho. Confiemos! Façamos uma novena a São Francisco Xavier, nosso protetor, e com certeza ele intercederá por nós, junto a Deus.

Ele era um homem muito piedoso e rezava insistentemente para que a Providência ajudasse sua pequena família. Quando estavam no último dia da novena, bem cedinho, bateram à sua porta. Era um homem entregando uma encomenda para Giacomo. Ele estava de folga e recebeu o pacote, buscando o remetente no papel, pois não encomendara nada e não sabia de quem poderia ser. Constava o nome “Francisco”. Não havia, porém, sobrenome, nem a proveniência…

– Bem, Mirella, eu não conheço nenhum Francisco – disse Giacomo Vejamos o que é!

Abriu o embrulho, e qual não foi a surpresa de ambos, quando se depararam com um belíssimo vaso de porcelana chinesa, com detalhes em ouro!

– Aí esta nossa solução! – disse Mirella – Vendamos este vaso e teremos o dinheiro suficiente para pagar o aluguel da casa! Meu Deus, quem será o santo homem que nos mandou este presente do Céu? Ou melhor, da China?

– Não faço ideia, mas realmente deve ter vindo de um homem de Deus! Só pode ser pela intercessão São Francisco Xavier, o apóstolo do Oriente!

– Vamos terminar nossa novena agora mesmo, agradecendo este imenso favor!

Com a venda do precioso vaso, o casal Gastinelli conseguiu salvar a pequena casa e ainda guardar alguma economia, suficiente para se manterem até que Mirella pôde voltar a trabalhar. Em honra ao santo, o benfeitor da família, deram ao filho o nome de Francisco.

Não havia chegado à esquina da rua da fábrica quando ouviu um grande estouro.
Não havia chegado à esquina da rua da fábrica quando ouviu um grande estouro.

O pequeno cresceu piedoso e religioso, como o pai, e muito devoto de seu padroeiro. Foi batizado, fez a primeira comunhão e casou-se na igrejinha de seu tão querido santo e, por esta razão, nunca quis se mudar daquelas proximidades, sendo vizinho de seus bons pais que, felizes, podiam visitar com frequência as netinhas.

Francisco tinha o bom costume de, todas as manhãs, depois de deixar suas duas filhas na escola, passar pela Igreja de São Francisco Xavier, antes de ir para a fábrica de fogos de artifício onde trabalhava, situada não muito longe dali, a fim de
fazer uma prece e oferecer a Deus o labor do dia.

Sua filha mais velha não poderia ter outro nome senão Francesca! Ela era muito espoleta e, desde que acordava, não parava de saltitar, ansiosa para ir o quanto antes para a escola. Ela queria ser professora quando crescesse.

Certo dia, quando saía com o pai e sua irmã mais nova para o colégio, levando na mão a maleta de estudos, esbarrou em um jarro de flores de sua mãe, que enfeitava a sala da casa, o qual se quebrou, ferindo-lhe a mão direita. Começou a chorar, assustada por ver o próprio sangue. Francisco, preocupado, levou-a o quanto antes para a farmácia mais próxima. Felizmente, o ferimento não era grave, todavia foi o suficiente para Francesca chegar atrasada em sua aula e a Francisco, se não corresse, lhe passaria o mesmo.

Ele correu tanto quanto pôde, temeroso de perder o emprego, pois conhecia bem a intolerância do chefe e seria a terceira vez que chegaria atrasado naquele mês, por questões de família. Passando defronte à Igreja de São Francisco, olhou o relógio e pensou consigo: “Faltam cinco minutos para meu horário… se não passo pela igreja e corro bastante, consigo chegar na hora!”. Olhou para a fachada da igreja e sentiu como se São Francisco o chamasse. Então, disse:

– Não, São Francisco não vai me deixar perder o emprego por causa dele…

E decidiu entrar! Naquele dia, a imagem de seu santo querido lhe parecia mais sorridente do que nunca. Contudo, não podia demorar muito: só tinha dois minutos! Rezou e saiu em disparada.

Não havia chegado à esquina da rua da fábrica, quando ouviu um grande estouro: BUMM!!!!!

Em poucos minutos só se via fogo e confusão. Os bombeiros chegaram, e logo apagaram o incêndio. Só depois de haver voltado a calma ao lugar, Francisco soube exatamente o acontecido: um acidente na seção em que trabalhava provocou a explosão, ferindo vários de seus companheiros.

Mais uma vez agradeceu a poderosa intercessão de São Francisco Xavier, pois se não tivesse ouvido a voz da graça, por poucos minutos já estaria no trabalho e só Deus sabe o que lhe teria acontecido… Seu bom costume de passar sempre pela igreja salvou não só o emprego, mas quiçá a sua vida! E isso graças à proteção de São Francisco, que acompanhou sua família desde antes mesmo de seu nascimento e nunca os abandonou.

Revista Arautos do Evangelho, Jun/2012, n. 126, p. 46-47

A chave do Céu

História para crianças

Irmã Daniela Ayau Valladares, EP

A chave do CeuCada vez que passava em frente ao convento dos franciscanos de sua pequena cidade, Lourenço sentia o coração bater mais forte. Gostava de ficar ouvindo do lado de fora o canto suave dos frades, vindo da igreja. Aquelas melodias angélicas, cheias de uma paz que não era deste mundo, pareciam provir do Céu. Outras vezes, ficava espiando os monges enquanto trabalhavam na horta e pensava: “Como eles são alegres! O irmão cozinheiro, carregando tomates, é mais feliz que os meus arrogantes companheiros se exibindo pela rua em seus ruidosos carros”.

Aos domingos, Lourenço assistia à pregação e depois meditava nas palavras do frade de feições austeras e voz possante: “Lembrai-vos sempre, irmãos, que mais importa guardar tesouros no Céu ao invés de multiplicá-los na Terra. O Senhor nos ensinou: ‘De que vale ao homem ganhar o mundo inteiro se vier a perder sua própria alma?’. Vede o exemplo de nosso pai São Francisco: soube ser pobre em espírito”.

Um dia, não resistiu e perguntou a um franciscano:

— O que devo fazer para morar aqui? O bom religioso deu-lhe uma resposta muito simples:

— Para viver abrigado por estas santas paredes é preciso desejar acima de tudo o Reino dos Céus, abraçando a pobreza em espírito, como fez Jesus.

Uma semana depois, o jovem, carregando apenas uma malinha, entrava no convento para não mais sair. Pediu para ser irmão leigo, pois queria viver só para Deus, servindo os frades.

O mestre de noviços, que passou a acompanhá-lo, se encantava com o exemplo do Irmão Lourenço. Ninguém varria o chão ou lavava os pratos com maior entusiasmo; todas as suas ações pareciam uma prece.

Um dia, Irmão Lourenço notou o hábito de um frade em mau estado, e comentou:

— Vejo que sua manga está rasgada. Quer que a costure? Senão, quando o irmão for para as missões, as pessoas vão reparar. Somos pobres, mas dignos, e não fica bem usar um hábito rasgado… Se me permitir prestar-lhe tal serviço me estará concedendo uma graça, pois sou um pecador e tenho faltas a reparar.

— Mas tu sabes costurar?

— Não muito bem… Porém, minha mãe é costureira e com ela aprendi algumas lições do ofício.

— Está bem — concluiu o frade —, vamos ver como sai o serviço.

Surpreendendo a todos, Irmão Lourenço fez um trabalho exímio. A cada ponto com a agulha tinha rezado uma jaculatória pedindo que a Santíssima Virgem de Nazaré costurasse por ele. Quando acabava a linha, rezava uma Ave-Maria. Dessa forma, cerziu a manga inteira, deixando- a como se fosse nova.

A notícia se espalhou pelo convento. Não demorou muito em aparecer o irmão cozinheiro com uma roupa queimada, quase perdida por causa de um forno muito forte. Também o irmão porteiro veio mostrar um buraco no seu hábito que, embora escondido, já estava ficando grande. Até mesmo certo frade estrangeiro, hospedado ali por alguns dias, pediu ao irmão que desse um jeitinho em sua velha vestimenta. Os hábitos voltavam cosidos, limpos e perfumados.

O superior se alegrou com a descoberta. Admirado ao ver a despretensão daquele filho, logo notou a assiduidade de suas visitas ao Santíssimo Sacramento. “É por isso que tudo faz com tanto primor”, pensava.

Passados alguns meses, ele percebeu que os dotes de Irmão Lourenço podiam ir além da habilidade de fazer remendos.

— Quer tentar fazer um hábito inteiro? — perguntou-lhe.

— Se com isso eu puder dar glória a Deus, perfeitamente!

A experiência foi coroada de êxito. Das mãos “orantes” daquele religioso, começaram a sair maravilhas acima das expectativas. Nelas a tesoura tomava vida e corria pelo tecido marrom em traçados tão certeiros, que o melhor dos alfaiates não poderia superar. Os hábitos continuavam modestos, mas possuíam algo de especial: a marca do amor com que o irmão os fazia.

Passaram-se os anos. Por vezes, a quantidade de pedidos o levava a dormir muito pouco, a perder as horas de recreação, e ele sentia a tentação de julgar que assim também já era demais… Mas logo pensava que Deus o chamara para glorificá-Lo daquela forma, e esse motivo o levava a dedicar-se por inteiro, redobrando as orações.

Irmão Lourenço tornou-se um homem maduro e, com o tempo, um ancião. Seus cabelos ficaram prateados, mas nem por isso deixou de atender os pedidos de remendos e costuras.

A comunidade o estimava e admirava. Muitos frades famosos, pregadores em santuários e professores em universidades, gostavam de estar com ele, formando rodas animadas de conversas sobre o Seráfico São Francisco, Santa Clara e outros heróis da Ordem. Irmão Lourenço atraía a todos, falando só sobre coisas do Céu. E era para lá que caminhava…

O implacável peso dos anos trouxe- lhe uma febre incurável, que começou a consumi-lo. Pressentindo a partida desta vida, ele pediu os Sacramentos e passou a falar cada vez menos. Rezava muito e pensava no encontro com Deus.

Numa madrugada gélida de inverno, Frei Lourenço parecia não resistir mais. O sino do convento chamou a comunidade para acompanhar o querido irmão, em seus últimos momentos. Ajoelhados, rezavam a oração dos agonizantes. De repente, um fio de voz quase imperceptível foi ouvido. Era Irmão Lourenço que pedia:

— Tragam-me a chave… a chave do Céu…

Os frades não entenderam. Qual seria essa “chave do Céu”? Um deles saiu correndo rumo à biblioteca e voltou com um livro chamado “A chave do Céu”. Colocaram-no diante do moribundo, mas ele não se interessou. Apenas repetiu: — Eu quero… a chave… a chave do Céu…

O superior mandou que trouxessem uma relíquia de São Francisco, à qual o enfermo tinha muita devoção. Mas ele seguia com seu raro pedido…

Então, a fisionomia de um irmão se iluminou. Cruzou rapidamente os corredores e voltou com a agulha de Irmão Lourenço. Ao vê-la, este esboçou um sorriso e disse:

— Sim, esta é minha chave do Céu! — e expirou.

* * *

Sem ser grande aos olhos do mundo, nem receber recompensa por seus serviços, Irmão Lourenço se santificara com uma agulha na mão, trabalhando por amor a Deus. Para cada um a Providência tem preparada uma “chave” que lhe abrirá o Céu. Trata-se de saber cumprir sua vontade e seus desígnios. “Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus” (Mt 5, 3).

Revista Arautos do Evangelho nº 101 – maio de 2010 – pgs. 46-47.