Santidade e Eucaristia


Por Padre Rafael Ramón Ibarguren Schindler*. Qual é a gênese, a origem, a base sobre a qual se assenta a santidade, aspiração de todo batizado? Parte de um reconhecimento sincero do nada da miséria humana, e do encanto pela totalidade única e benevolente que é Deus. O cântico do Magnificat proclamado pela Santíssima Virgem, é como a rocha firme sobre a qual se constrói o edifício da santidade. Essa disposição de espírito humilde e agradecida, constitui o preâmbulo necessário para ser Santo, antes mesmo da prática dos mandamentos, do exercício das obras de misericórdia, ou da compreensão dos artigos do Credo. Sem humildade e sem o poder de Deus que nos auxilia com sua graça, não há mérito nem há santidade.

Humildade, Santidade e Eucaristia desigual e maravilhosa trilogia! Todos os Santos do Céu e da terra têm sido ou são almas eucarísticas e humildes. Também as do purgatório, por certo, ainda que quiçá poderiam ter sido um pouco mais…

Com propriedade se diz de alguns Santos que são especificamente eucarísticos, como São Pascoal Bailão, São Pedro Julião Eymard ou São Manuel González. Estes fizeram de suas vidas um culto apaixonado ao Santíssimo e um apostolado ardente do mistério eucarístico. Mas todos os Santos foram ou são familiares da Eucaristia, nas três instâncias que compõem a Igreja Católica: a triunfante, a purgante e a militante.

Agora, podemos nos perguntar foram Santos porque adoravam a Eucaristia, ou é pelo fato de ter-se santificado que chegaram a ser almas eucarísticas? Parece uma pergunta inútil, pois se diria que ambas as coisas se equivalem, mas não é assim. A resposta se impõem e é segura: se santificaram -entre outras razões mas muito fundamentalmente- porque adoraram o Sol Eucarístico que iluminou seu caminhar.

Porque a Eucaristia não é algo acidental nem, muito menos, um mistério “descartável” na vida espiritual. Ela é Deus ‘hic et nunc‘, aqui e agora Jesus Cristo ressuscitado está somente à direita do Pai e na Hóstia consagrada!

Consideremos a obrigação dominical de participar da Missa. Não se concebe que um católico não a cumpra. Não somente é fazer ato de presença ocupando um banco na igreja; tão pouco há que estar consolado ou cheio de desejo de ir à Missa, não. É ir à Missa sabendo do que se trata e participando com atenção e respeito. Em todo caso, abençoada relutância contra a qual se cumpre o dever! Mas, quão poucos cumprem o preceito!

 

Além do mandamento, há outras fortes motivações para ir à Missa: o benefício de escutar da Palavra de Deus e de receber a Comunhão, a possibilidade de reconciliar-se com Deus mediante a confissão se fosse necessário, a bênção que se recebe; também o reencontro com amigos e conhecidos, o bom exemplo dado na família, a vizinhos, a comunidade. Outra coisa: o fato de que se dá um encontro com os Anjos, o que não é dizer pouco, porque onde está o Santíssimo, estão os Anjos adorando-o… à espera dos homens. É que a Missa é algo infinito! É a renovação e atualização do sacrifício da Cruz que me redimiu e me abriu as portas do Céu; assistindo a ela, se aplicam a minha pessoa os méritos infinitos de Cristo. Como perder minha Missa?

Mas o propósito de santificar-se e o amor à Eucaristia não se cifram somente no cumprimento do preceito dominical. A palavra “Missa”, do latim, missio, significa “envio”. E o rito de despedida é eloquente: “Ite Misa est”, “ide em paz”, “glorifiquem ao Senhor em suas vidas”, “que o Senhor lhes acompanhe”, ou como se diz, segundo as regiões. É um envio formal, um mandato: há que passar toda a semana à luz do duplo banquete que se serve na Missa, o da Palavra e o da Eucaristia, que vai criando raízes na alma, às vezes imperceptivelmente, enriquecendo a vida interior.

O domingo é o Dia do Senhor; é o primeiro e principal da semana, é o dia da Ressurreição. Os outros dias serão consequência de como se tenha vivido. Se não se cumpre o preceito, não se terão as energias para passar a semana de forma cristã e se estará muito mais exposto às quedas e aos fracassos. O sabemos por experiência… Agora, se por uma razão justa não se pode ir à Missa, não há falta. Mas há que ter claro o valor intrínseco da Santa Missa que vale infinitamente mais que outras tantas “coisas importantes”…

Os dias da semana são um tesouro para nossa santificação e não devem ser desperdiçados: A vida em família, o trabalho e o estudo, as relações com outras pessoas, a oração, as visitas ao Santíssimo, as obras de bem, enfim, todas as coisas grandes ou pequenas do dia a dia, feitas ao sopro do envio dominical.

 

Concluindo, digamos algo muito conhecido, mas pouco considerado: o chamado à santidade é universal, posto que há um desígnio individual de Deus sobre cada pessoa que deve cumprir-se. Com a energia que dá a Eucaristia, se pode realizar esse desígnio. Prescindindo da Eucaristia, nunca. E tanto é assim, que Santo Anselmo, Doutor da Igreja, sentenciou: uma só Santa Missa oferecida e ouvida em vida com devoção, pelo bem próprio, pode valer mais que mil Missas celebradas pela mesma intenção, depois da morte.

Se uma só Missa vale tanto, o que não valerá a Missa semanal? E que valor não terá uma vida inteira à luz da Eucaristia regularmente adorada e celebrada? Que valor? O valor de forjar Santos e de abrir as portas do Céu.

Começa o ano de 2020, cheio de incógnitas… iniciemos com o propósito de ser Santos sob o manto de Maria e familiarizando-nos com o Pão da Vida. A não ser que não queiramos que o Senhor “obre grandes coisas em nosso favor” (cf. Lc 1, 49) ♦

São Paulo, janeiro 2020.

*Assistente Eclesiástico das Obras Eucarísticas da Igreja.
Traduzido por Emílio Portugal Coutinho.

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