Até na hora da aparente derrota, o Sumo Bem sempre vence

Domingo de Ramos da Paixão do Senhor

Aos louvores da entrada triunfal de Nosso Senhor em Jerusalém logo se sucederam as dores da Paixão. Como explicar este paradoxo?

Monsenhor João Scognamiglio Clá Dias, EP


Domingo de Ramos, início das dores

Com a Encarnação do Verbo a obra das trevas conheceu sua ruína. E o confronto entre o bem e o mal encontrará sua arquetipia, até o fim dos tempos, na luta implacável de Nosso Senhor contra os escribas e os fariseus, narrada longamente por todos os evangelistas. O maldito filão do mal encontrou diante de si um Varão que fundou uma Instituição para combatê-lo, o Homem-Deus diante do qual foi obrigado a ouvir as verdades mais contundentes e penetrantes, a ponto de ser-lhe arrancada a máscara da hipocrisia, aos olhos de todo o povo.

Na Liturgia do Domingo de Ramos vamos assistir ao desfecho dessa luta. Nesse dia a Igreja comemora, ao mesmo tempo, as alegrias da entrada triunfal de Nosso Senhor Jesus Cristo em Jerusalém e o início de sua Via Sacra, com a proclamação da Paixão no Evangelho da Missa. Abre-se, assim, a Semana Santa, talvez o período do Ano Litúrgico mais cogente, durante o qual as principais celebrações se sucedem, convidando-nos a considerar com especial fervor os acontecimentos que constituem o cerne de nossa Redenção.

Anúncio do Evangelho (Lucas 23,1-49)

Narrador 1: Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo Lucas.

Naquele tempo, 1toda a multidão se levantou e levou Jesus a Pilatos. 2Começaram então a acusá-lo, dizendo:

Ass.: “Achamos este homem fazendo subversão entre o nosso povo, proibindo pagar impostos a César e afirmando ser ele mesmo Cristo, o Rei”.

Narrador: 3Pilatos o interrogou:

Leitor 1: “Tu és o rei dos judeus?”

Narrador: Jesus respondeu, declarando:

Pres.: “Tu o dizes!”

Narrador: 4Então Pilatos disse aos sumos sacerdotes e à multidão:

Leitor 1: “Não encontro neste homem nenhum crime”.

Narrador: 5Eles, porém, insistiam:

Ass.: “Ele agita o povo, ensinando por toda a Judeia, desde a Galileia, onde começou, até aqui”.

Narrador: 6Quando ouviu isto, Pilatos perguntou:

Leitor 1: “Este homem é galileu?”

Narrador: 7Ao saber que Jesus estava sob a autoridade de Herodes, Pilatos enviou-o a este, pois também Herodes estava em Jerusalém naqueles dias. 8Herodes ficou muito contente ao ver Jesus, pois havia muito tempo desejava vê-lo. Já ouvira falar a seu respeito e esperava vê-lo fazer algum milagre. 9Ele interrogou-o com muitas perguntas. Jesus, porém, nada lhe respondeu.

10Os sumos sacerdotes e os mestres da Lei estavam presentes e o acusavam com insistência. 11Herodes, com seus soldados, tratou Jesus com desprezo, zombou dele, vestiu-o com uma roupa vistosa e mandou-o de volta a Pilatos. 12Naquele dia Herodes e Pilatos ficaram amigos um do outro, pois antes eram inimigos.

13Então Pilatos convocou os sumos sacerdotes, os chefes e o povo, e lhes disse:

Leitor 1: 14“Vós me trouxestes este homem como se fosse um agitador do povo. Pois bem! Já o interroguei diante de vós e não encontrei nele nenhum dos crimes de que o acusais; 15nem Herodes, pois o mandou de volta para nós. Como podeis ver, ele nada fez para merecer a morte. 16Portanto, vou castigá-lo e o soltarei”.

Narrador: 18Toda a multidão começou a gritar:

Ass.: “Fora com ele! Solta-nos Barrabás!”

Narrador: 18Barrabás tinha sido preso por causa de uma revolta na cidade e por homicídio.20Pilatos falou outra vez à multidão, pois queria libertar Jesus. 21Mas eles gritaram:

Ass.: “Crucifica-o! Crucifica-o!”

Narrador: 22E Pilatos falou pela terceira vez:

Leitor 1: “Que mal fez este homem? Não encontrei nele nenhum crime que mereça a morte. Portanto, vou castigá-lo e o soltarei”.

Narrador: 23Eles, porém, continuaram a gritar com toda a força, pedindo que fosse crucificado. E a gritaria deles aumentava sempre mais. 24Então Pilatos decidiu que fosse feito o que eles pediam. 25Soltou o homem que eles queriam — aquele que fora preso por revolta e homicídio — e entregou Jesus à vontade deles.

26Enquanto levavam Jesus, pegaram um certo Simão, de Cirene, que voltava do campo, e impuseram-lhe a cruz para carregá-la atrás de Jesus. 27Seguia-o uma grande multidão do povo e de mulheres que batiam no peito e choravam por ele. 28Jesus, porém, voltou-se e disse:

Pres.: “Filhas de Jerusalém, não choreis por mim! Chorai por vós mesmas e por vossos filhos! 29Porque dias virão em que se dirá: ‘Felizes as mulheres que nunca tiveram filhos, os ventres que nunca deram à luz e os seios que nunca amamentaram’. 30Então começarão a pedir às montanhas: ‘Cai sobre nós! e às colinas: ‘Escondei-nos!’ 31Porque, se fazem assim com a árvore verde, o que não farão com a árvore seca?”

Narrador: 32Levavam também outros dois malfeitores para serem mortos junto com Jesus.33Quando chegaram ao lugar chamado “Calvário”, ali crucificaram Jesus e os malfeitores: um à sua direita e outro à sua esquerda. 34Jesus dizia:

Pres.: “Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!”

Narrador: Depois fizeram um sorteio, repartindo entre si as roupas de Jesus. 35O povo permanecia lá, olhando. E até os chefes zombavam, dizendo:

Ass.: “A outros ele salvou. Salve-se a si mesmo, se, de fato, é o Cristo de Deus, o Escolhido!”

Narrador: 36Os soldados também caçoavam dele; aproximavam-se, ofereciam-lhe vinagre,37e diziam:

Ass.: “Se és o rei dos judeus, salva-te a ti mesmo!”

Narrador: 38Acima dele havia um letreiro:

Leitor 2: “Este é o Rei dos Judeus”.

Narrador: 39Um dos malfeitores crucificados o insultava, dizendo:

Leitor 2: “Tu não és o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós!”

Narrador: 40 Mas o outro o repreendeu, dizendo:

Leitor 1: “Nem sequer temes a Deus, tu que sofres a mesma condenação? 41Para nós, é justo, porque estamos recebendo o que merecemos; mas ele não fez nada de mal”.

Narrador: 42E acrescentou:

Leitor 1: “Jesus, lembra-te de mim, quando entrares no teu reinado”.

Narrador: 43Jesus lhe respondeu:

Pres.: “Em verdade eu te digo: ainda hoje estarás comigo no Paraíso”.

Narrador: 44Já era mais ou menos meio-dia e uma escuridão cobriu toda a terra até as três horas da tarde, 45pois o sol parou de brilhar. A cortina do santuário rasgou-se pelo meio,46e Jesus deu um forte grito:

Pres.: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito”.

Narrador: Dizendo isso, expirou.

(Aqui todos se ajoelham e faz-se uma pausa.)

Narrador: 47O oficial do exército romano viu o que acontecera e glorificou a Deus, dizendo:

Leitor 1: “De fato! Este homem era justo!”

Narrador: 48E as multidões, que tinham acorrido para assistir, viram o que havia acontecido e voltaram para casa, batendo no peito. 49Todos os conhecidos de Jesus, bem como as mulheres que o acompanhavam desde a Galileia, ficaram a distância, olhando essas coisas.

— Palavra da Salvação.

— Glória a vós, Senhor.

Entrada triunfal em Jerusalém

Entre os numerosos milagres realizados pelo Divino Mestre, nenhum produzira tanta comoção em Israel quanto a ressurreição de Lázaro (cf. Jo 11, 1-44). A uma simples ordem, o morto de quatro dias saíra do túmulo andando, em perfeita saúde. Por evidenciar de forma tão grandiosa o poder divino de Jesus, o prodígio ocasionou um forte surto de fervor popular e muitos judeus passaram a crer n’Ele. Em contrapartida, tal fato acirrou ao extremo o ódio dos pontífices e fariseus. Reunido o Sinédrio, deliberou este acerca dos meios para fazer cessar a crescente fama de Nosso Senhor e, “desde aquele momento, resolveram tirar-Lhe a vida” (Jo 11, 53).

O Redentor, que tudo sabia, já tinha conhecimento desta decisão oficial do Sinédrio quando começou a viagem de volta à Cidade Santa, nas vésperas das comemorações da Páscoa. No caminho Ele advertira os discípulos a esse respeito, ao anunciar-lhes pela terceira vez a Paixão: “Eis que subimos a Jerusalém e o Filho do Homem será entregue aos príncipes dos sacerdotes e aos escribas; condená-Lo-ão à morte e entregá-Lo-ão aos gentios” (Mc 10, 33). Contudo, nada fez para impedir a afluência das pessoas que acorriam ao seu encontro e passavam a segui-Lo durante o percurso. Eram israelitas em sua maior parte, os quais também se dirigiam ao Templo para celebrar a Páscoa, de modo que, quanto mais se aproximava da cidade, maior se tornava o número dos que O acompanhavam. Saindo de Jericó, por exemplo, registra São Mateus que “uma grande multidão O seguiu” (20, 29), e São João menciona outra “grande multidão de judeus” (12, 9) que se concentrou em Betânia ao saber que Jesus ali havia chegado. Toda essa gente foi com Ele a Jerusalém, pelo que “bem se pode supor que formavam o cortejo várias centenas, e até mesmo milhares de pessoas”, diz Fillion.

É precisamente a essa altura do percurso, nas proximidades de Betânia e Betfagé, que se inicia o trecho de São Lucas recolhido para o Evangelho da Procissão do Domingo de Ramos do Ano C.

Os louvores começaram logo que Nosso Senhor montou o jumentinho, ainda na estrada. À sua passagem o povo ia estendendo os mantos no chão e completava esse improvisa-do tapete com ramos colhidos das ár-vores (cf. Mt 21, 8; Mc 11, 8). Quando já se podia divisar o Templo — o que, segundo indicação precisa de São Lucas, corresponde a “perto da descida do Monte das Oliveiras” —, a multitudinária procissão irrompeu em exclamações e brados de alegria:

“Bendito o Rei, que vem em nome do Senhor! Paz no Céu e glória nas alturas!”. Tal movimentação pôs em alvoroço a cidade, que regurgitava de peregrinos vindos de todas as regiões da Palestina, os quais, saindo ao encontro de Jesus com ramos de palmas nas mãos, uniram-se à caravana, para também aclamá-Lo (cf. Jo 12, 12-13).

Esse cortejo triunfal — mas quão modesto para Aquele que é Rei e Criador do universo! — realizava literalmente a profecia messiânica de Zacarias: “Dança de alegria, cidade de Sião; grita de alegria, cidade de Jerusalém, pois agora o teu rei está chegando, justo e vitorioso. Ele é pobre, vem montado num jumento, num jumentinho, filho de uma jumenta” (9, 9).

Inteira conformidade com a vontade do Pai

Ora, até então Nosso Senhor sempre evitara qualquer homenagem ostensiva à sua realeza, impondo silêncio àqueles que reconheciam n’Ele o Salvador. No momento em que o povo quis proclamá-Lo rei, logo após a primeira multiplicação dos pães, Ele Se havia esquivado, retirando-Se sozinho para um monte (cf. Jo 6, 15). Na entrada em Jerusalém neste dia, pelo contrário, aceitou com inteira naturalidade as honras e aplausos. Tal atitude, além de permitir que as pessoas por Ele beneficiadas manifestassem sua gratidão de maneira formal, tinha em vista também a Paixão, pois era preciso ficar notório e testemunhado pelo próprio povo que o Crucificado era o descendente de Davi por excelência, o Messias esperado.

Vemos aqui ressaltada a plena conformidade de Nosso Senhor com a vontade do Pai. Quando Lhe foi pedido o apagamento, o Divino Redentor o abraçou por completo: nasceu numa Gruta da pequena Belém e recebeu tão somente a adoração dos pastores e dos Magos vindos de terras longínquas. A única reação de Jerusalém à notícia de seu nascimento fora a pertur-bação (cf. Mt 2, 3), e nenhum de seus habitantes saíra à procura do rei dos judeus recém-nascido para Lhe prestar homenagens. Entretanto, chegado o momento propício de sua glorificação pelos homens, Ele acolheu com benevolência os brados que O proclamavam Rei de Israel, assim como, durante anos, aceitara ser chamado de “filho do carpinteiro” (Mt 13, 55).

Na resposta à insolente interpelação dos fariseus pedindo-Lhe que censuras-se seus aclamadores, Jesus deixou bem claro ser esse triunfo a realização de um desígnio divino, o qual se cumpriria mesmo se os homens se negassem a louvá-Lo: “Eu vos declaro: se eles se calarem, as pedras gritarão”.

Triunfo prenunciador da Paixão

Um detalhe da cerimônia litúrgica indica outro aspecto do Domingo de Ramos, sem o qual não nos seria possível entender seu significado mais profundo: o sacerdote celebra revestido dos paramentos vermelhos, cor própria à comemoração dos mártires.

Devido à sua personalidade divina, para Nosso Senhor tudo é presente, tanto o passado quanto o futuro. Por conseguinte, Ele via que dentro de alguns dias, uma vez mais, estrugiriam nas ruas de Jerusalém brados bem diferentes dos que então O reconheciam como Filho de Davi. Diante de Pilatos, o popula-cho vociferaria pedindo sua crucifixão e a libertação do vulgar bandido, Barrabás.

A esse respeito, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira faz uma observação: “Os pintores católicos que reproduziram a cena apresentam Nosso Senhor recebendo com certo bom grado aquela homenagem, mas com um fundo de tristeza e ao mesmo tempo de severidade, porque Ele compreendia o que aquilo tinha de vazio, e que o povo que O aclamava, sem pensar nisso, reconhecia a sua própria culpa. […] Ele desfila bondoso e triste; Ele sabe o que O espera”.

O triunfo de Jesus em Jerusalém não era senão o prenúncio de seu martírio na Cruz. Os evangelistas, sempre muito sintéticos, tiveram especial diligência ao consignar a Paixão de Cristo, acontecimento de importância ímpar na História. É por isso que o Evangelho da Missa deste domingo excede em extensão o habitual dos demais, o que impossibilita comentar cada um de seus versículos no exíguo espaço de um artigo.

Façamos, então, uma reflexão que nos coloque na adequada perspectiva para contemplar as maravilhas oferecidas pela Liturgia do Domingo de Ramos, de modo a obtermos os melhores frutos para nossa vida espiritual.

O mal se coligou para matar Nosso Senhor

No relato da dolorosa Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, um dos aspectos mais salientes é a união de todos os maus ao se depararem com o Sumo Bem encarnado. O Evangelho refere, por exemplo, que “naquele dia Herodes e Pilatos ficaram amigos um do outro, pois antes eram inimigos” (Lc 23, 12), causando-nos um espontâneo movimento de surpresa e indignação. Antigas rixas pessoais por questões políticas ficaram encerradas em função da condenação do Salvador. É uma regra da História que encontra aqui seu paradigma: os maus, ainda que hostis entre si, sempre juntam forças quando se trata de fazer face ao bem.

É verdade que Pilatos não agia motivado por ódio a Jesus e não O tratou com vulgar desprezo, como o fez Herodes, mas por receio de desagradar a César; e que em Herodes, mesclada com a curiosidade, predominava o sentimento de inveja. Certo é, porém, que eles se uniram contra o Homem-Deus quando seus caminhos se cruzaram. Da mesma forma, voluntária ou involuntariamente, se aliaram ao Sinédrio, contra o qual, todavia, ambos alimentavam antigos desacordos e inimizades.

Isso nos ensina como as desavenças entre os maus não alcançam, em geral, grande profundidade de alma, circunstância, aliás, posta em relevo pelo famoso comentário de Clemenceau, o astuto e anticlerical estadista francês, do fim do século XIX, entrando no XX: dois homens, por mais inimigos que sejam, se unem na cumplicidade caso frequentem as mesmas casas de tolerância. Podemos inferir desta afirmação que, pelo contrário, o ódio que dedicam ao bem, de modo especial quando este surge com muito esplendor, é inextinguível, e ambos entram numa conjuração para destruí-lo.

Entre os maus, há graus de perversidade que originam indecisão ou lentidão. Quando Nosso Senhor se encontrava perante Herodes, “os sumos sacerdotes e os mestres da Lei estavam presentes e O acusavam com insistência” (Lc 23, 10); ante a dúvida de Pilatos, uma vez mais “os chefes dos sacerdotes faziam muitas acusações contra Jesus” (Mc 15, 3), pressionando o governador com argumentos falazes. Por fim, ao ser proposta a libertação de Jesus, “os chefes dos sacerdotes atiçaram a multidão para que Pilatos soltasse Barrabás” (Mc 15, 11) e por isso o povo insistia gritando “com toda a força, pedindo que fosse crucificado. E a gritaria deles aumentava sempre mais” (Lc 23, 23). Sua histeria não diminuiu enquanto o Divino Prisioneiro não foi entregue “à vontade deles” (Lc 23, 25).

Ódio dos maus, indiferença dos bons

Nessas horas, lamentavelmente, muitos daqueles que se têm na conta de virtuosos não abraçam com decisão e coragem o partido do bem, permitindo, por isso, a expansão do domínio do mal. “Esta é a vossa hora e do poder das trevas” (Lc 22, 53), lamentava-se o Salvador no momento de ser preso, sem que ninguém dentre os seus mais próximos tomasse sua defesa de maneira eficaz.

Boa parte dos que haviam aclamado Jesus na entrada em Jerusalém com ramos e brados, por não terem aderido com profundidade ao Bem, estavam mais tarde no meio da multidão vociferante votando por Barrabás.

Não nos custa admitir que na turba que exigia a condenação do Senhor estivesse alguém a quem Ele houvesse restituído a vista, e que não reagia diante do infame espetáculo; outro a quem Ele tivesse devolvido a audição e a fala, e que ouvia aquelas blasfêmias sem levantar a voz para protestar; outro, ainda, ao qual Ele houvesse curado da paralisia e que tivesse caminhado até ali apenas para saciar sua malsã curiosidade, assistindo impávido ao sofrimento de quem o beneficiara. Talvez muitos não quisessem que Nosso Senhor fosse crucificado, mas, por se terem deixado influenciar pelos maus, acabaram participando do pior crime já cometido na História. Todos, contudo, eram indiferentes, quando não hostis ao Divino Mestre.

Para evitar que também nós nos transviemos, seja no caminho da tibieza e da indiferença, seja no da ingratidão e da traição, devemos progredir com firmeza nas vias da santidade e cultivar nossa indignação ante o avanço ousado dos que recusam a Jesus. Sempre que os bons não entram pelas sendas da radicalidade, o mal leva a melhor.

Cabe aqui remover uma objeção no tocante à virtude da humildade: não será melhor e mais conforme aos ensinamen-tos de Nosso Senhor que os bons sejam humildes e resignados? A resposta é afirmativa no tocante a injúrias feitas a nós mesmos. Porém não é acertada se o alvo das agressões injustas forem as coisas sagradas, a Santa Igreja Católica ou alguma pessoa inocente. Em tal caso, manter-se passivo é repetir a atitude dos que assistiram com indiferença aos sofrimentos de Jesus Cristo.

É sublime o exemplo que Nosso Senhor nos dá despojando-Se de Si mesmo e aceitando todas as injúrias por nossa salvação. No entanto, ao mesmo tempo precisamos aprender a lição de que, em certas circunstâncias, a indiferença pode constituir um pecado maior do que o ódio. O contrário seria uma atitude semelhante a alguém que, sendo assaltado por um ladrão em sua própria casa, assistisse com indiferença e de braços cruzados às piores agressões contras seus familiares mais próximos. Seria esta atitude própria a um bom pai, filho ou esposo?

Assim, na Paixão de Nosso Senhor o que mais chama a atenção não é a sanha dos inimigos, mas a indiferença dos bons. É este um aspecto esquecido, ainda que da maior importância, que cumpre ser lembrado hoje.

A solução para o problema do mal

Na meditação da Liturgia do Domingo de Ramos encontramos o fiel da balança para o problema da luta entre o bem e o mal. Com a Encarnação, Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, o mal sofreu sua derrota definitiva, porque passou a vigorar sobre a face da Terra o regime da graça. Foi este o meio determinado pela Sabedoria Divina para acabar com a vitalidade e o dinamismo da linhagem de satanás, o qual, inconformado, tudo faz para se vingar; por isso a luta entre o bem e o mal continua sem tréguas, hoje mais do que nunca.

Quanto a nós, católicos, não podemos ignorar tal realidade, na qual, aliás, estamos envolvidos. E devemos estar muito atentos para um aspecto de suprema importância: esse embate se trava também dentro de nós. Da mesma forma como no Paraíso Terrestre existia a serpente, em nosso interior há serpentes que fazem um trabalho muito mais ladino do que o demônio com Eva. São nossas más tendências, em virtude do pecado original, sempre de tocaia, esperando uma oportunidade para nos arrastar para o partido dos tíbios e indiferentes. Nessa batalha interna cabe-nos manter o mal amordaçado e humilhado, e dar ao bem toda a liberdade, o que só podemos alcançar com a graça de Deus.

O mal é limitado, o bem é infinito

Como ensina a filosofia perene, o mal é uma ausência de bem. O mal absoluto não existe, ao contrário do que pretendem as correntes dualistas. Sendo, pois, uma mera negação do bem, por si só não tem força para derrotá-lo. Deus é o Sumo Bem, o Bem em essência, e quem se unir com integridade a Ele, portanto, se tornará invencível, como que revestido da própria onipotência divina.

Destas reflexões, nascidas da Liturgia que abre a Semana Santa, devemos tirar uma lição para os nossos dias, em que o mal e o pecado campeiam com arrogância pelo mundo inteiro: da luta entre o bem e o mal resulta necessariamente a vitória do bem, de modo que, cedo ou tarde, os justos serão premiados e “farão brilhar como uma tocha a sua justiça” (Eclo 32, 20).

No momento em que uma parte ponderável da humanidade vira as costas a seu Criador e Redentor, somos chamados a crer com firme confiança que, como Nosso Senhor triunfou outrora contra todas as aparências de derrota, triunfará de novo restabelecendo a verdadeira ordem: “No Senhor ponho a minha esperança, espero em sua palavra” (Sl 129, 5). ²9) ♦

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