“Alegrai-vos”, mas… como?”

Naquele tempo, 10 as multidões perguntavam a João: “Que devemos fazer?” 11 João respondia: “Quem tiver duas túnicas, dê uma a quem não tem; e quem tiver comida, faça o mesmo!” 12 Foram também para o batismo cobradores de impostos, e perguntaram a João: “Mestre, que devemos fazer?” 13 João respondeu: “Não cobreis mais do que foi estabelecido”. 14 Havia também soldados que perguntavam: “E nós, que devemos fazer?” João respondia: “Não tomeis à força dinheiro de ninguém, nem façais falsas acusações; ficai satisfeitos com o vosso salário!” 15O povo estava na expectativa e todos perguntavam no seu íntimo se João não seria o Messias. 16 Por isso, João declarou a todos: “Eu vos batizo com água, mas virá aquele que é mais forte do que eu. Eu não sou digno de desamarrar a correia de suas sandálias. Ele vos batizará no Espírito Santo e no fogo. 17 Ele virá com a pá na mão: vai limpar sua eira e recolher o trigo no celeiro; mas a palha ele a queimará no fogo que não se apaga”. 18 E ainda de muitos outros modos, João anunciava ao povo a Boa-nova (Lc 3, 10-18)

III Domingo do Advento (Domingo Gaudete)
Comentário ao Evangelho

No dia em que a Liturgia Católica oferece ao fiel uma pausa
jubilosa em meio à penitência do período de Advento, o Precursor
nos indica o “que devemos fazer” para encontrar a verdadeira
alegria, tão ansiada por toda criatura.

Mons. João S. Clá Dias, EP

Um remanso de alegria em meio à penitência

A Liturgia da Igreja reúne sucessivamente, ao longo do ano, os mais variados sentimentos: a tristeza na Semana Santa; o gáudio transbordante, porém cheio de temperança, na Ressurreição; a esperança durante o período do Tempo Comum; o júbilo festivo nas grandes solenidades.

Em certo momento ainda, nos deparamos com uma manifestação — quiçá uma das mais acentuadas dentro da Liturgia — de conforto e felicidade em meio à penitência. Essa é a nota característica de dois domingos únicos no ano: o 4º Domingo da Quaresma, que leva o título de Lætare, e o 3º Domingo do Advento, designado pelo nome de Gaudete. Neste último, sobre o qual refletiremos, a Igreja abre um parêntese na ascese e na preocupação constante de uma conversão — atitudes próprias à época do Advento e preparativas para a vinda de Nosso Senhor — para tratar da alegria, infundindo-nos novo ânimo.

“Alegrai-vos sempre no Senhor!”

Gaudete, primeira palavra da antífona de entrada da Missa do dia, significa “alegrai-vos”, e é extraída da epístola de São Paulo aos filipenses: “Alegrai-vos sempre no Senhor; eu repito: alegrai-vos. […] O Senhor está próximo!” (Fl 4, 4-5). Com efeito, a esperança no nascimento de Jesus deve ser acompanhada de sinceros desejos de mudança de vida. Estas moções interiores precisam, no entanto, de um estímulo, e é justamente o que recebemos neste 3º Domingo de Advento: as flores voltam a ornar os altares, os instrumentos tornam a tocar durante a Celebração Eucarística e os paramentos se tingem de suave róseo para simbolizar a exultação e a ideia de um descanso.

Toda a Liturgia, inclusive as leituras e orações, está centrada no gáudio, porque nossa Santa Religião não caminha para a tristeza nem nos conduz para uma vida de eternos sofrimentos, mas, pelo contrário, nos abre a perspectiva de um futuro feito de júbilo e consolação.

Só em vista dessa felicidade tem sentido estarmos dispostos a sofrer, conforme nos explica o mesmo Apóstolo: se não fosse a Ressurreição de Nosso Senhor, vã seria nossa fé (cf. I Cor 15, 14). A Ressurreição de Cristo é a promessa da nossa própria ressurreição e, portanto, do nosso gozo eterno. Qual seria o valor de todo o esforço feito durante a vida, se não houvesse a garantia final de um prêmio, de uma eternidade feliz? Sem este incentivo nós desanimaríamos. Assim sendo, toda a nossa atenção deve-se concentrar num só ponto: em determinado momento estaremos no convívio com Deus!

Tal é o empenho da Liturgia deste domingo: encher-nos de gáudio em vista do futuro. Devemos, então, considerar o Evangelho partindo da perspectiva desse júbilo sobrenatural, fundado no fato de sermos filhos de Deus e de termos a promessa de uma eternidade junto a Ele, se perseverarmos nas vias do bem, até o fim.

Diante da aproximação do Salvador: alegria… e conversão!

Por tudo isso, ante a proximidade do nascimento de Nosso Senhor, a Igreja deseja para os fiéis a degustação — um tanto antecipada — das consolações, fervores e toques da graça própria às doçuras da festa do Natal.

Neste 3º Domingo, portanto, uma nova etapa se abre no Advento: o 1º Domingo fez uma clara referência à vinda do Salvador; o 2º tornou ainda mais expresso e aberto o mesmo anúncio; e agora se afirma, pela pena de São Paulo, “O Senhor está próximo!”

Ora, se a razão pela qual nós devemos nos alegrar é o nascimento de Jesus, temos de fundamentar esse contentamento no cumprimento da Lei de Deus, no desejo contínuo de uma transformação interior. O Evangelho desta Liturgia projeta, mais uma vez, a profética figura do Precursor, chamando todos para isso.

A alegria está ao nosso alcance

Ter sempre em vista a própria ressurreição, apesar de conhecer perfeitamente a desintegração dos corpos, depois de enterrados e transformados em poeira; ter uma esperança de, post mortem, entrar num convívio eterno com Deus, depois de ter recuperado o mesmo corpo em estado glorioso para no Céu gozar da felicidade eterna; aí está o que nos dá força e coragem. Então, por que correr atrás de alegrias onde elas não existem?

A insubstituível felicidade da boa consciência

Inúmeras vezes ignoramos ou nos esquecemos de que a perda da inocência batismal constitui o maior prejuízo da vida. Significa perder o maior tesouro a nós confiado pelas dadivosas mãos da Providência, pois, perdida esta inocência, logo as más inclinações se manifestam com mais veemência e é comum as quedas se sucederem, podendo inclusive chegar a alma à triste situação apontada por Nosso Senhor no Evangelho: “Todo homem que se entrega ao pecado, torna-se seu escravo” (Jo 8, 34).

De fato, quando cometemos a infelicidade de cair no pecado, estamos enganosamente à procura de alguma felicidade decorrente de um prazer, o qual julgamos ser infinito e eterno.

Tal prazer, entretanto, é sempre fugaz e submerge nossa alma na frustração. Ó natureza débil! Corres atrás de um vazio pensando haver encontrado o absoluto, vais à procura da alegria onde ela não se encontra! Com propriedade afirma Santo Agostinho: “Alegrar-se na injustiça, alegrar-se na torpeza, alegrar-se nas coisas vis e indecorosas… em tudo isso cifra o mundo sua alegria; em tudo isso que não existiria se o homem não quisesse. […] A alegria do século consiste na maldade impune. Entregar-se à dissolução dos homens, fornicar, divertir-se nos espetáculos, embriagar-se, manchar-se de torpezas sem nenhum contra empo: eis aqui a alegria do mundo. Mas Deus não pensa como o homem, e uns são os desígnios divinos, outros os humanos”.

Na deliberação de abraçar o pecado nos afastamos da verdadeira e insubstituível alegria da boa consciência, que nenhuma fortuna, nenhum prazer carnal, nenhum orgulho satânico, nenhuma glória mundana pode oferecer. Se, algum dia, tivermos a desventura de manchar nossa inocência, procuremos logo readquirir um coração puro e um espírito firme (cf. Sl 50, 12), lavando e purificando a alma no Sacramento da Confissão. Quem nunca sentiu a consolação pela certeza de haver sido perdoado, ao sair de um confessionário, não conhece uma das maiores felicidades que nesta vida se pode experimentar. O gáudio de recuperarmos a inocência perdida vale mais do que tudo na face da Terra.

Alegria: o verdadeiro dinamismo interior

Concluindo, é preciso compreender que, mesmo nas piores situações, jamais podemos nos deixar abater; ao contrário, devemos estar sempre cheios de confiança. Deus, segundo o ensinamento maravilhoso apresentado no Evangelho da Liturgia de hoje, está continuamente à nossa disposição e ainda quis nos dar sua própria Mãe para nos acompanhar e atender.

Sigamos, portanto, o conselho de Santo Agostinho: “‘alegrai-vos sempre no Senhor’, isto é, alegrai-vos na verdade, não na iniquidade; alegrai-vos na esperança da eternidade, não com as flores da vaidade. Alegrai-vos desse modo e em qualquer lugar, e em todo tempo lembrai-vos de que ‘o Senhor está próximo! Não vos inquieteis com coisa alguma’”.

Sejamos alegres até em meio às piores tragédias, pois a alegria manterá em nós o dinamismo e a força necessária para praticar a virtude. Dessa forma, o Menino Jesus encontrará nossas almas prontas para recebê-Lo no supremo momento em que nascerá misticamente na Sagrada Liturgia e em nosso coração.


Excertos da obra “O Inédito sobre os Evangelhos”. Vol. 05. Tempo do Advento.

amor aparecida apostolado apostolado do oratório arautos do evangelho arautos sacerdotes cidades comentario ao evangelho comunhão reparadora comunidade coordenadores Cristo deus devoção encontro eucaristia evangelho familias fátima grupos do oratorio heraldos del evangelio igreja imaculado coração de maria jesus liturgia maria meditação missa missao mariana Monsenhor João Clá Dias natal Nossa Senhora nossa senhora de fátima nosso senhor Notícias o inédito sobre os evangelhos oratório oração paróquia peregrinação Plinio Correa de Olivieira primeiro sábado santa missa santíssima virgem

Deixe uma resposta